Turismo

Preços da hotelaria próximos dos 'low-cost'

Ordem dos economistas diz que situação deve ser alvo de reflexão

Embora se defina como um destino de excelência, os preços praticados na hotelaria da Madeira têm diminuído nos últimos anos, o que, de acordo com uma investigação levada a cabo por um estudante de mestrado da Universidade da Madeira, leva a que se torne inviável a instalação de um hotel 'low-cost' na Região.

O trabalho de Bruno Côrte, aluno do mestrado em Estudos Regionais e Locais, tem por tema 'Contributos para o estudo da viabilidade de um hotel 'low-cost' na Madeira' e foi o vencedor do prémio 'Madeira Valor Mais', da responsabilidade da Ordem dos Economistas, com a parceria do DIÁRIO e da Caixa Geral de Depósitos, o qual foi entregue ontem numa cerimónia, realizada na sala do Senado, na Universidade.

De acordo com Bruno Côrte, nos últimos anos tem havido um quebra nas tarifas praticadas na hotelaria, mesmo nos hotéis de cinco, quatro e três estrelas, e isso impede que hóteis que oferecem menos serviços, como é o caso dos hóteis 'low-cost', a maioria equiparados a três estrelas, possam entrar no mercado a preços competitivos em relação aos hóteis de três estrelas tradicionais.

O estudante sublinha que, hoje em dia, existem hotéis de três estrelas a praticarem tarifas de 35 e 40 euros por noite. "Obviamente que o hotel 'low-cost' teria de entrar no mercado a preços mais competitivos", o que leva a que uma aposta deste género seja "pouco viável".

"Não quer dizer que no futuro isso não posso ser possível", salientou.

De acordo com Bruno Côrte, de 2008 para 2012 houve uma quebra de 6% na taxa líquida de ocupação, sendo que as dormidas diminuíram 4,9% de 2011 para 2012. Razão que levou também a uma baixa de preços.

Para Eduardo Jesus, presidente da Delegação Regional da Ordem dos Economistas, o facto de a Madeira se ter tornado num destino barato é um alerta que fica neste trabalho, sobretudo tratando-se de um "destino de excelência" e com com uma oferta muito diversificada.

Eduardo Jesus refere que, nas estatísticas de 2012, a Madeira voltou a registar um rendimento por quarto muito baixo, à volta dos 30 euros, sem contar com a inflação. "Não há destinos no mundo que consiga captar investimento directo estrangeiro com um rendimento por quarto tão baixo", disse.

O responsável da Ordem dos Economistas na Madeira refere que essa é a razão para que a Região não tenha presentemente cadeias internacionais. "Já tivemos e já não temos."

Na opinião de Eduardo Jesus, esta realidade deve merecer "uma reflexão muito forte para quem governa os destinos deste sector" e também no sector empresarial, em "grande aflição", o que é notório pelo facto de existirem "mais de 10 hóteis que estão permanentemente em situação de venda".

Por seu lado, a representante da Caixa Geral de Depósitos, Francisca Perry Vidal, manifestou o desejo de ver mais alunos da UMa a concorrerem ao prémio, salientando também que muitos dos colaboradores do banco têm sido nos últimos anos recrutados na Universidade da Madeira.

Presente igualmente na cerimónia, o director do DIÁRIO ressalvou a importância de premiar o mérito numa casa onde os jovens representam um "valor acrescentado para a sociedade". Jovens esses que têm 'Voz na Matéria' na TSF e também nas páginas do matutino.

Síntese: Contributos para o Estudo de Viabilidade da Implementação de um Hotel Low-Cost na MadeiraBruno CôrteResumo de Dissertação de Mestrado em Estudos Regionais e Locais - Universidade da Madeira.Prémio "Valor Mais" 2012, na categoria de "Ciências Económicas".

A utilização da terminologia low-cost é hoje comum a vários sectores comerciais/industriais. Este modelo de gestão estratégica e (de marketing) revolucionou as vendas no sector da aviação comercial nos EUA, tendo-se propagado depois também para outras latitudes/setores comerciais.

No caso do transporte aéreo, o modelo low-cost foi iniciado pela Southwest Airlines no ano 1971, sendo adotado na Europa por varias companhias aéreas, como a Ryanair (1985) e a Easyjet (1995). A relação entre o setor aviação e hotelaria é evidente sobretudo em regiões como a Madeira, com a chegada de turistas dependente sobretudo do acesso aéreo. Considerando o sucesso comercial de algumas companhias aéreas low-cost que operam em Portugal e na Região, o objetivo desta investigação centrou-se no estudo da aceitação do modelo em relação ao alojamento, através do desenvolvimento da hotelaria low-cost na Madeira.

Oferecer ao cliente o essencial (do serviço/produto) pelo preço mais baixo é o lema principal da estratégia comercial low-cost, modelo de negócio que visa suprimir serviços que são oferecidos nas instalações hoteleiras tradicionais, visando a redução de custos e consequentemente a oferta de tarifas mais baixas para o cliente mantendo os níveis de qualidade.

Um dos fatores que desvirtua o conceito low-cost em Portugal é o fato de ser uma estratégia aplicada sem qualquer parâmetro estabelecido. Muito frequentemente a denominação low-cost é apenas utilizada para publicitar ao cliente o slogan "preços mais baratos que a concorrência". Esse elemento é verificável na maioria dos hotéis low-cost estudados em Portugal (à exceção do Easyhotel localizado na cidade do Porto) onde as tarifas praticadas podem ser superiores às dos hotéis tradicionais. Constata-se então ser complexa a afirmação de um segmento de mercado específico de budget hotels dada a inexistência de diferenciais de preço como principal fator diferenciador para o cliente.

A especificidade do mercado regional torna a Madeira mais vulnerável às mudanças do mercado, pela sua condição geográfica e a dependência face à acessibilidade aérea, o que se reflete na menor capacidade de resposta às mudanças do setor dada a dimensão do mercado. As características do mercado turístico regional são identificáveis por Richard Butler (1980) no modelo de ciclo turístico, como um destino em estagnação, o que requer uma reestruturação das estratégias e políticas turísticas no intuito de inverter essa tendência. Nesse sentido a renovação do POT para a Região será fundamental na implementação de estratégias de angariação de novos mercados turísticos e no desenvolvimento da possibilidade de oferecer ao visitante uma maior oferta de experiências.

Tendo em conta os resultados obtidos no inquérito realizado, a implementação de um hotel low-cost na Madeira, que ofereça menos serviços e facilidades ao clientepor valores similares aos já praticados pelas unidades hoteleiras existentes de igual categoria, não seria viável. A análise dos dados do presente estudo comprovou que os clientes apenas abdicariam de alguns serviços prestados tradicionalmente por reduções de preços muito significativas. Essas reduções nas tarifas seriam incomportáveis com a rentabilidade de uma futura unidade hoteleira low-cost.

É possível sugerir que o cliente vê satisfeitas e superadas as suas expectativas, em relação ao bem adquirido relativamente ao preço e que muito dificilmente uma unidade hoteleira low-cost poderia oferecer um "package" mais atrativo que pudesse concorrer atualmente com as unidades hoteleiras existentes na mesma categoria.

Uma alternativa à redução de tarifas, reside na diferenciação e na seleção dos mercados a atingir o que permite em teoria evitar as guerras de preços com mercados concorrentes. Esta estratégia permite enfrentar a concorrência em posição preferencial obtendo vantagens e resultados em nichos específicos, evitando entrar numa espiral de descida de preços. Dada a elevada probabilidade de reduções futuras de preços, urge estudar e aplicar medidas que permitam manter contante o nível médio de despesa no destino, através da deslocação de despesa do item alojamento para outros serviços (ex. acesso a bens culturais, desporto, gastronomia, etc).

Importa referir que qualquer conclusão retirada do presente estudo não poderá nem deverá ser considerada como definitiva para o futuro, sendo esta apenas uma primeira abordagem a um segmento recente em Portugal (e ainda mais na Madeira) pelo menos no setor da hotelaria.